Sombras da Meia-Noite - Capítulo Seis

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Todos já se acomodavam na mansão. Faltava apenas uma pessoa. E esta, chegou com sua devida capa negra, um capuz cobrindo sua cabeça, próprio dos Tremére. Todos olhavam-na com descrença, mas sentia que não era a primeira vez que recebia esse olhar. Caminhou para dentro da sala, onde os demais jaziam sentados. Retirou o capuz do rosto, seus cabelos negros escorregando por seu ombro, e fitou cada um dos presentes, com seus olhos verdes, brilhando na penumbra, apenas luz de velas em uns poucos castiçais.


Lázarus fica de pé. O Príncipe, com um gesto, o faz sentar-se. Sheyla percebe a agitação, Clóvis fica atento a cada movimento da recém-chegada.

— Milena.

O Príncipe a recebe com um sorriso. A Tremére voa até à frente, onde está o Príncipe Ventrue.

— A bela Milena de volta. Bem... estão todos aqui?

Milena sente o cheiro de cada um ali, inclusive de Ricardo, que chegara mais cedo.

— Se ainda conheço o cheiro de vampiro, creio que estejam todos aqui.

— Nem todos, meu bem.

Todos se voltam. Agora, Milena não era mais o centro das atenções, pois, parada à soleira da porta, estava uma bela mulher, alta, alva, via-se que não era proveniente da região. Seus cabelos loiros caíam em cachos pelos ombros, sua presença irradiava fascinação em todos. Ela percebera, aliás, sempre que chegava em algum lugar, que provocava o mesmo tipo de reação, vampiros ou humanos. Tinha o poder de chamar a atenção para si, desde muitos séculos.

— Agora, estamos todos aqui.

A voz era clara e firme. Milena sabia quem era, mas não queria nem pensar. Seus olhos estavam grudados nos olhos dela. A voz do Príncipe atrás de si a tira de quase um transe hipnótico.

— Terás o prazer de conhecer a nova Anciã do clã Tremére. Creio que não ficarás chateada, afinal, foi ela quem abraçou sua senhora, Lady Anthonya.

Milena se viu sem voz. Até que o lacaio da Tremére a anuncia, um pouco atrasado.

— A Baronesa de Chatêau DuMont, senhora Marie Françoise Rosé.

Ouve-se um “ohhhh” de admiração na sala. Milena olha para a francesa e lembra-se das palavras de Lady Anthonya.

“— Ela me deixou... a procurei por toda parte... não a encontrei...”

— É um prazer imenso... um grande prazer... conhecê-la, senhora.

As duas Tremére se olham, cada uma perscrutando o olhar da outra, como duas cobras venenosas se fitando. Milena sai e senta-se perto de Ricardo, Clóvis e Sheyla. Os líderes do Ventrue, Gangrel e Toreador, perceberam que ali havia uma aliança. Marie caminha solenemente, sentando-se ao lado de Lázarus.

Rudolph cogita as possibilidades à sua frente. Uma guerra estava declarada. De um lado, os Brujah, Nosferatu e Milena, com Ricardo, dois Tremére poderosos. De outro, os Malkavian, os Gangrel e os Tremére, liderados por Marie. Marie era uma anciã, mas não a única. Sua aparição causou medo e ela acabou com muitos neófitos, mas os anciãos estavam preparados para uma guerra. Seria uma guerra sangrenta. Os Ventrue, aristocratas e nobres, talvez não se envolvessem, eram em sua maioria líderes da Camarilla, não olhariam para mais uma briga, Jyhad. Mas os Toreador, eles sim, perderiam muito ficando no meio do fogo cruzado. Precisava se aliar a alguém. Tinha laços de sangue com Lázarus, Marie era muito mais forte, mas a idéia de ter Milena como aliada era muito mais divertida. Rudolph era um ancião experiente. A fúria da anciã lendária poderia ser apenas boatos, uma aparição cinematográfica para assustar outros. Pelo sim, pelo não, preferiu o mais difícil.

O Príncipe, com seus sentidos aguçados, percebeu a mudança do clima daquela noite. Ele não era nenhum diplomata, e também não estava muito aí para as alianças entre os clãs de seu território. Estava no poder por causa das suas próprias alianças, e a política era poder pelo poder. Vigiava o que os demais vampiros faziam, e deixava-os fazer o que bem entendiam, mas, quando algo lhe interessava, algo que pudesse lhe trazer mais, seu jogo preferido era manipular os seus.

Milena também percebera os ânimos de todos alterados. Se houvesse um termômetro naquela sala, estaria fervendo. Marie tinha o cheiro mais puro de um Tremére da quinta geração. Não tinha preocupação alguma, ao contrário, estava tranqüila e confiante. Lázarus tinha o cheiro da euforia, felicidade, ansiedade; contava com uma vitória antes do tempo. Se dependesse de Milena, faria guerra. Se venceria, não sabia. Ela também era uma lenda. Uma vampira que, aparentemente, tivera sua Morte Final. Mas não fora assim, voltara das sombras. E trouxera de vota seu neófito, Ricardo. Dois vampiros jovens, de geração antiga. Isso era um rebuliço.

Ela não notara, mas também estava sendo perscrutada. Marie, com seus instintos poderosos, podia sentir até mesmo o sussurrar de seus pensamentos, os leria se fosse possível. Percebia que fazia planos, conjecturas. Aliás muitos ali faziam isso. Com quem se aliariam, contra quem ficariam, tudo para atender seus próprios interesses. Todos eles perto dela, até mesmo o Príncipe, seriam muito pouco, não mais que formigas, as quais esmagará com o salto de seu sapato. Quanto a Lázarus... Lázarus! Um pobre vampiro Malkavian... acreditava mesmo que ela se unira a ele. Mas seria melhor assim. Pelo menos, teria um pouco de diversão. Depois ela mesma, pessoalmente, o destruiria. Por enquanto, o manteria perto.



À saída da Primigênie, Milena e Ricardo se aproximam da porta, que fora aberta por Marie. Clóvis e Sheyla se mantém à distância, mas observando a tudo e a todos. Marie e Lázarus chegam perto e provocam. A voz sarcástica da Baronesa de Chatêau DuMont era de arrepiar.

— Vejo que não gostou muito de minha presença, querida.

Milena não esconde seu desagrado. Nem poderia.

— Realmente... não. Por que gostaria?

— Não sei... todos me adoram!

— Infelizmente para você... eu não sou igual a todos. Terá de se contentar com um súdito a menos, querida.

Marie sorri, superior. Ronda Milena, falando rente ao seu ouvido, com voz calma e comedida, quase num sussurro.

— Eu sei o que sentes. Sentes medo. E não sem razão. Sentirás muito medo de mim, chérie. Há muito tempo venho buscando por algo que anime minha eternidade e encontrei você. Será muito interessante ajudar Lázarus em seus planos. Só por diversão. Se eu quisesse matá-los, já o teria feito. Não teria levado mais que poucos minutos. Agora, preste atenção: poderás fazer algo por ti mesma. Aceite se casar com o Malkavian, apesar de eu torcer para que lutes com ele... isto é... comigo. Eu te darei vantagem. Ficarei imóvel, esperando teus ataques!

Desta vez, quem ri é Milena.

— Você por acaso foi contratada por Lázarus para ser sua advogada?

— Não querida. Como eu disse, quero uma diversão.

— Pois terá sua diversão. E se depender de mim, não sorrirás tanto no final.

— Veremos.

Milena sai, certa de que seu blefe era claro no que era: um blefe. Retira-se acompanhada de Ricardo, Clóvis e Sheyla. Rudolph assiste a tudo.

Na rua, Milena e Ricardo se preparam para voltar à mansão, quando Rudolph os impede.

— Milena.

Milena observa o Toreador, impecável em seu modo de vestir-se, com uma delicadeza, polidez e educação fora de série.

— Pois não.

— Quero que saiba que eu e o clã Toreador, estaremos do seu lado.

— Agradeço a união, mas não ganharás algo com isso. Não te ofereço nada em troca. Eu não me importo em absoluto com o que pensas ao meu respeito ou a respeito dessa guerra. Não ligo a mínima para os seus assuntos e seus interesses. Se quer ficar ao meu lado, faça o teu que eu farei o meu. 

— Pense bem, Tremére. Precisarás de ajuda contra sua Anciã.

— Sei que precisarei, mas não quero me atar aos Toreador. Se queres ficar, fica por conta própria, nos estaremos também ao teu lado no momento da guerra. Conheço sua fama, Rudolph. Já disse, se quiser ficar ao meu lado, ficarás, mas não sentirei sua falta se me trair.

— Sua consideração para com minha pessoa é impressionante. Mas não me importo. Provarei que sou digno de vossa confiança.

— Digno de minha confiança? Sinto em você o cheiro da traição sorrateira e do bote que pretende dar. Mas lhe digo uma coisa: faça o que quiser, fique do lado que bem entender, mas se fizer algo para me prejudicar, eu juro pelo sangue de Abel e pelo legado de nossa história, que até sua memória vai ser exterminada pelas minhas mãos.

Milena levanta voo com Ricardo, seguida pelos olhares auspícios do Toreador. Ele fica quase encantado, paralisado, pela beleza do voo de Milena.

— És de meu agrado, Tremére. Será uma grande aventura.

Rudolph também levanta voo, e desaparece nas nuvens escuras. Ao longe, toda a conversa fora ouvida por uma poderosa francesa.


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