Cosmic - Capítulo Cinco

Chegando agora? Acompanhe esta história do início, clicando AQUI.




Sistema Alpha Centauro
Planeta Metharia
Cinco anos antes do Grande Colapso


Kali correu de volta para a Colmeia, segurando numa das mãos as saias do vestido e na outra, um segredo. Entrou na ala quatro, reservada apenas para os familiares dos grandes comandantes e foi para seus aposentos. Trancou-se em seu quarto e fechou todas as janelas, olhando todos os cantos para ver se não havia algum Tsarif, pequeninos espiões em forma de bolhas que se escondiam nas casas para observar seus habitantes.

Não encontrando nenhum, permitiu-se relaxar. Correu até o monitor e acoplou o pequeno dispositivo que trazia na mão. Tocou a tela com os dedos e acessou o que havia roubado.

Os planos de seu marido eram insanos. Ela não fazia ideia do que estava por vir. Só o fato de ter esse vislumbre a fazia correr perigo. Precisava gravar uma mensagem, antes que se perdesse.


Gravou rapidamente e guardou-a debaixo da pele da mão, onde havia um pequeno corte para depositar memórias em microcamps, pequeninos chips de armazenamento. Todos nasciam com aquele depositário, desde que passaram a guardar as memórias dos antepassados para as gerações futuras, e isso já tinha mais de cinquenta anos.

Kali respirou e pensou se seu filho sobreviveria àquilo que estava por vir.

Ouviu batidas insistentes na porta.

"Kali, abra a porta. Sabemos o que você fez!"

O medo acumulou-se em ondas sob sua pele, e paralisou-a. Sabia que deveria fugir, mas estava acuada. Olhou para a janela e viu a altura insana até o chão. Não sairia viva.

"Kali! Vamos arrombar!"

O barulho do arrombamento não demorou muito. Então, seu marido estava lá, no meio de seu quarto, acompanhado de seus acólitos, e juntos formavam os Sete Imortais.

"Kali... como pôde? Temos um trabalho a fazer. E você invadiu a inteligência, agora precisamos eliminá-la, o que é uma pena, pois você é uma mulher muito querida."

O grande homem alto e loiro fez sinal para um dos seus homens, e ele se aproximou ameaçadoramente. Eram todos muito grandes, como era característico dos Sete Imortais, e seus olhos irradiavam uma luz violeta. Kali segurou as mãos sobre o rosto e gritou.

"Estou grávida! Estou esperando um filho do Grande!"

O Imortal parou e olhou para a mulher, em seguida para o homem a quem ela se referia, seu esposo.

"Neste caso", disse o esposo, "a levaremos conosco. Mas ficará presa até o nascimento da criança. Se for um menino, seguirá meus passos. Se for uma menina, terá o mesmo destino que você."

Em seguida, o homem, a quem Kali conhecia por Ashtar Sheran, saiu, e os Sete Imortais deixaram a atmosfera de seu quarto, que agora seria sua prisão dali por diante, mais pesada do que nunca.

***



As naves da Frota Intergaláctica são de uma tecnologia especial, onde tudo é controlado pelo poder da mente extremamente desenvolvida dos comandantes, e o conforto está justamente em todos estarem em liberdade dentro delas. Grandes esferas, como bolhas espelhadas, e a entrada se dava por uma pequena abertura embaixo delas. Para Kali, nada daquilo fazia sentido. Não compreendia todas aquelas coisas, mas sabia que os dias de Metharia estavam contados.

Seu planeta havia sido exaurido às últimas consequências, e agora precisavam peregrinar e encontrar outro lugar para viver. Milhares e milhares de naves como aquela, comportando inúmeros Metharianos, deixaria o planeta moribundo para destruir-se. Mas nem todos viajariam. Apenas os "melhores" iriam. Muitos seriam deixados para trás, para morrerem com o colapso.

A maioria ficaria para trás. E Kali sabia que estava ali apenas porque carregava no ventre o filho de Ashtar. Isso fazia dela quase uma deusa. Apesar da prisão, recebia sempre tratamento especial, mas mesmo assim, sabia que morreria após o parto, e que, se o bebê fosse uma menina, teria o mesmo destino.

Esperava ter tempo suficiente para inserir o microcamp em sua palma após o nascimento, antes que alguém visse o que faria. E esperava sinceramente que fosse um menino, e que ele entendesse, um dia, tudo o que ela fez e quem realmente seu pai era, independentemente da educação que recebesse.

Olhou para as criadas que a serviam. Pareciam anjos de luz. Olhou para o exterior da nave, e viu bilhões de estrelas e milhares de esferas que estavam juntas em uma mesma viagem. Suspirou, tocando seu ventre esticado pelos sete meses de gravidez. Faltava pouco para conhecer seu destino final.

***



Sistema Solar
Planeta Terra
Dias atuais

Eu ainda esperava uma resposta de Ashenk. A pergunta pairava no ar como uma neblina densa e palpável, e o silêncio parecia mais palpável ainda. Apesar disso, eu esperei, sem pressioná-lo a não ser com o olhar. Finalmente, ele cedeu.

"O Shan é o planeta do sistema que há maiores possibilidades de sustentar a vida Methariana. Por isso, depois de o marcarmos, usamos a maior fonte de energia que pode sustentar nossas frotas e alimentar nosso povo."

"E que tipo de energia é essa? Mineral? Natural? Como?" Eu não estava entendendo. Se era isso, eles iriam dizimar nossos recursos naturais ou vir morar conosco?

Ele olhou para mim. "Não, nenhuma destas."

"E qual seria?"

"Energia vital humana."

O silêncio voltou a reinar e me sentei para respirar, pois parecia que estava sufocando. "O que quer dizer?"

"Usamos vocês, humanos, como usinas naturais. Captamos toda a energia de vocês para nós."

"Mas... mas isso não é possível... Algo..."

"Algo não se encaixa?" Ele completou o que eu não conseguia raciocinar.

"Sim! Como pode isso? É possível haver outros Shan por aí? Com humanos?"

Ashenk levantou-se e caminhou até a janela. "É diferente, mas a base é a mesma. Não são o mesmo tipo de humanos. Eu e você, viemos do mesmo ancestral, é como se fôssemos humanos. Mas não o mesmo tipo, entende? São como os... como dizem? Macacos? Que existem várias raças deles? Como cachorros ou pássaros, que em essência são a mesma coisa ainda que sejam diferentes?"

Eu não conseguia responder, e Ashenk não se deu ao trabalho de olhar para mim. Apenas olhava para o céu enquanto falava.

"Somos mesma essência, embora diferentes. Existem vários mundos por aí, vários Shans como o seu. Onde os habitantes são da mesma essência humana."

"E quem é esse ancestral comum? Esse ser humano, ou o que quer que seja?"

"Adhaim é o seu nome."

Aquele nome não  me era estranho. A pronúncia parecia-se muito com...

"Adam? Adão? O primeiro homem bíblico?"

Ele pareceu não entender a referência, mas sabia que eu tinha chegado à mesma conclusão. Parecia que todos os seres que eles encontraram em outros Shan tinham as mesmas histórias sobre o ancestral comum. Adão.

Minha visão escureceu e não pude dizer mais nada, pois o ar já estava me faltando há tempos. Acredito que desmaiei, pois acordei uma hora depois sozinha em meu quarto, e nem sinal de Ashenk.

Corri até a janela e tentei enxergar a frota, mas eu já sabia que não poderia ver nada. Nós seríamos destruídos, sugados, ou seja lá o que for, e nem perceberemos quando acontecer.

O fator surpresa.


Voltar ao Capítulo Quatro       -          Capítulo Seis

Share this:

JOIN CONVERSATION

    Blogger Comment

0 comentários:

Postar um comentário