Olhos da Meia-Noite - Capítulo Um

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Livremente inspirado no jogo de RPG, Vampiro - A Máscara.




As ruas do Recife Antigo estavam animadas. Como sempre. Festas, bares, bebidas, dança, muita música. Milena preferia deixar a música ao longe. Abraçada ao namorado, pensava em casamento. Mas ele preferia nem ouvir falar no assunto. E aquela rua escura...

Ele a empurra contra a parede antiga de um casarão para beijá-la. Incrível como os homens não dão a mínima para os sentimentos das mulheres. Só estão interessados em seu corpo. E que corpo. Milena não gostava de falar de si mesma, mas tinha um corpo de dar inveja a qualquer garota de qualquer idade. Alta, morena, cabelos negros como aquela noite, lisos até a cintura. Delgada, corpo bem esculpido metido num jeans. Mas o que mais chama atenção são seus olhos. Verdes.

O casal se abraça na rua e não percebe que alguém os observa. Um par de olhos cor de âmbar olha bem de perto a cena, seu dono escondido na escuridão da rua.

— Pare.

— O que foi? Agora é que tá ficando bom!

Milena sentia que tinha alguém perto. Alguém que lhe dava medo. Um passo no escuro denuncia que estava certa. Uma folha seca aguça os instintos de Milena.

— Pare! Tem alguém aqui!

— Isso é impressão sua. Agora me beija.

Milena se irrita, mas perde totalmente a fala, ao ver uma mulher bastante alta, elegantemente vestida, com olhos amarelados e brilhantes se aproximar por trás de seu namorado. A mulher, com passos firmes e olhar duro, continua caminhando em direção aos dois. Milena sente um frio na espinha. Isso bastava para o soltar o grito preso em sua garganta. No mesmo instante, a estranha mulher toca o ombro de seu namorado e o atira longe numa força surpreendente. Milena vê-se desprotegida diante da mulher, que a segura e aproxima o rosto de seu pescoço.



Milena sente a mordida da mulher, e percebe que é tarde para fugir. Não tem mais forças para se manter em pé, e escorrega até o chão, a mulher grudada em seu pescoço, sugando sua vida, suas energias, seu sangue. Seus olhos fecham-se devagar, a luz começa a sumir, escuridão total.

Milena sente seu corpo mais leve, mas é tudo muito escuro. Ao longe, vê uma luz, uma luz brilhante, que a atrai, a chama, a suga. Vai até ela, sente-se flutuar! Como é bom! Um suave aroma invade suas narinas, cheiro de grama molhada, cheiro de ar puro! Ah, como queria chegar até aquela luz!

De repente, Milena sente seu corpo ser sugado para trás, a luz desaparece. Uma dor imensa toma conta de seu ser, sendo quase impossível respirar ou até mesmo pensar, como se milhões de facas penetrassem seu corpo, como se sua pele se rasgasse de uma extremidade à outra. O grito que sai de sua garganta é quase incontrolável, mas Milena sequer o ouve. Seu corpo se debate em convulsões contínuas, até que se acalma, como por encanto a dor desaparece, o cansaço toma conta e relaxa, sua respiração se torna suave.

A mulher observa Milena, descansando no chão de tamanha dor, e se lembra de seu próprio abraço, igualmente traumatizante. Seu braço com um corte deixa o sangue respingar nos lábios da moça, que o agarra e o suga sofregamente.

Milena respira fundo e recosta a cabeça na parede. A mulher observa a transformação dela. Seus cabelos tornam-se mais escuros e mais lisos, com um brilho negro que jamais mudaria. Seus olhos abrem-se devagar, mostrando um verde brilhante.

Milena olha para a mulher, abaixada à sua frente. Seu porte era esguio e sua pele clara. Seu rosto rosado e seus cabelos cor de mel, à altura dos ombros. Seus olhos, numa tonalidade âmbar. Milena está cansada demais para falar qualquer coisa. A mulher levanta-se e, com imponência, segura Milena nos braços e ergue-se no ar, levando-a consigo.


***



Milena observara tudo durante a viagem pelos ares, nos braços da desconhecida. Incrivelmente achava tudo muito natural. Não se lembrava muito bem do que acontecera, só sabia que havia sido bastante doloroso. E, apesar de tudo ter sido causado por aquela mulher, sentia nela uma segurança inexplicável. Talvez, por um segundo que fosse, um certo arrependimento. Mas tinha certeza de uma coisa: mudara. Mudara muito, e era irreversível. Não seria nunca mais a mesma.

Chegaram a um casarão abandonado, algo que teria sido uma mansão no passado, mas que agora era apenas atestado da história e da passagem do tempo. A mulher continuava com Milena nos braços e não parecia se cansar. Um lacaio abre a porta da frente e as duas entram.

A sala era bem cuidada, os móveis, apesar de antigos, bem conservados. Toda a iluminação era escassamente feita por velas. A mulher atravessa a sala e sobe as escadas devagar. O lacaio desaparece nas sombras.

O quarto onde chegaram era bastante simples, mas confortável; havia no ar um cheiro de cravos e as cortinas negras cobriam toda a parede das janelas, do teto ao chão. A escuridão seria total, não fosse algumas velas na cômoda. A cama era grande, mas talvez não se deitasse alguém ali há muito tempo. A mulher deixa Milena em cima da cama.

— Qual o seu nome, menina?

Milena fica um segundo em silêncio. Suas lembranças ainda estavam embaralhadas e sua mente se adaptava aos poucos ao seu novo ser.

— Milena.

— Bem, eu sou lady Anthonya, mas há muito não uso mais o título. Chame-me apenas de Anthonya.

Lady Anthonya observa Milena sentada na cama, com ar assustado, mas um pouco mais confiante. E também muito bonita. Esperava que desse uma boa aprendiz. Com os dons herdados através do abraço, seria uma grande representante do clã, quando chegasse a hora. Teria de trabalhar muito. Mas dessa vez, seria bastante dura. Não aconteceria com ela o que aconteceu à primeira.

— Durma. Você precisa descansar. O dia já vai nascer.

Antes que Milena pronunciasse alguma palavra, lady Anthonya apaga as velas e sai, deixando-a sozinha na escuridão. Mas, para Milena, não fez diferença alguma. Seus olhos adaptaram-se facilmente e passou a enxergar melhor que na claridade. Respirou fundo e fechou os olhos. Ao longe, um galo canta.

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